Artigo
Business Transformation Culture and Leadership
A prática da liderança num mundo global

A prática da liderança num mundo global

Susana Carvalho | Culture Setting | Managing Partner

As organizações são sistemas técnicos e humanos em permanente ajustamento e adaptação ao contexto, o que coloca sobre a liderança o desafio de, continuamente, ter de lidar com a incerteza, com a complexidade e com diversidade humana. Estas três forças são cada vez mais fortes e requerem da liderança, segundo a autora, um ajustamento e calibração no seu centro de gravidade. Mais trabalho:

1. Institucional e simbólico, para lidar com a incerteza;

2. De integração, para lidar com a complexidade;

3. De identidade, para lidar com a diversidade.

Ir além do transacional e operacional: a ação simbólica da liderança

O ser humano precisa de se sentir enraizado, precisa de pertencer e de se ligar a algo maior, com o qual se identifique; precisa de compreender. A somar a esta necessidade humana, a incerteza e a disrupção provocadas pela mudança vêm reforçar a necessidade de unir as pessoas em torno de um propósito. É função da liderança dar sentido e construir significados comuns que alinhem as pessoas em torno de uma missão e valores partilhados.

As empresas, por outro lado, precisam de mobilizar as pessoas para as permanentes mudanças em curso. Precisam de legitimar o esforço individual e coletivo requerido para fazer face às pressões do contexto. É através do trabalho institucional e simbólico que as ações e decisões da liderança podem ser percebidas como legítimas. As organizações terão mais pessoas mais fortemente comprometidas se estas compreenderem o sentido, o significado e as razões por detrás das decisões e da direção escolhida.

O trabalho institucional e simbólico faz-se através do que é comunicado e veiculado, através do exemplo, e dos valores e princípios visíveis nas decisões de gestão e nos comportamentos do dia-a-dia. Qual é o desafio? O da consistência e o da frequência. Ou seja, o de conseguir que toda a estrutura de liderança, do topo à base, consiga incorporar no discurso e linguagem, nas suas narrativas, nas práticas de liderança e no comportamento, os mesmos princípios e valores.

“O trabalho institucional e simbólico faz-se através do que é comunicado e veiculado, através do exemplo, e dos valores e princípios visíveis nas decisões de gestão e nos comportamentos do dia-a-dia.”
O líder como arquiteto e engenheiro humano

Os problemas e desafios nas organizações tornaram-se complexos – deixaram de ser problemas meramente técnicos e ganharam uma natureza adaptativa, o que significa que para serem resolvidos ou endereçados é necessário que se deem alterações na forma de pensar, colaborar e de agir nas equipas. Por outro lado, têm muitas das vezes uma natureza sistémica – a relação entre a causa e o efeito não é linear –, o que obriga a pensar sistemicamente, e a ver o sistema como um todo, algo a que os líderes não estão habituados; além de que as organizações não estão ainda, muitas delas, desenhadas para facilitar esse trabalho.

As organizações precisam de ser redesenhadas para se tornarem mais ágeis, porque os problemas não podem ser resolvidos por áreas ou em silos, mas sim por um sistema interdependente de trabalho. O trabalho de Integração, enquanto papel da liderança é o de diluir barreiras social e estruturalmente construídas e o de modelar comportamentos colaborativos. Os desafios do presente e do futuro requerem, como tão bem sabemos, mais e melhor colaboração e mais multidisciplinaridade, a todos os níveis na organização. O diálogo e práticas de trabalho colaborativas são a chave para dar resposta à complexidade crescente do contexto.

As reuniões nas organizações – a forma como são conduzidas e a sua dinâmica de interação –, constituem um excelente laboratório para observar a cultura em ação e um barómetro para aferir a qualidade dos diálogos e a agilidade para resolver problemas e tomar decisões de forma colaborativa, do topo à base. Porque mexer nas estruturas leva tempo e é complexo, o trabalho de integração deve e pode ser feito a um nível mais informal por via da distribuição do poder, da delegação da decisão, de ligar pessoas e equipas de diferentes áreas, de aproximar as equipas dos clientes para agirem rapidamente no local, e de garantir que no topo a interdependência e a colaboração são modelados através do exemplo, porque os problemas são comuns e partilhados. Este trabalho deveria tomar 20 a 25% do tempo dos líderes, até porque tem efeitos duradouros na cultura e na inovação.

“O diálogo e práticas de trabalho colaborativas são a chave para dar resposta à complexidade crescente do contexto.”
Design Sem Nome (14)
Criar identidade coletiva potenciando a individualidade e a diversidade

A capacidade de uma organização para lidar com os seus desafios ao longo do tempo, se adaptar e inovar decorre da força da sua cultura e do talento e potencial humano instalados. Essa é a sua maior fonte de vantagem competitiva porque é inimitável.

O potencial e talento podem recrutar-se, mas o verdadeiro desafio está em desenvolvê-los, utilizá-los e ativá-los através de práticas de trabalho e da criação de ecossistemas onde podem florescer e trabalhar de forma colaborativa para resolver os desafios e os problemas correntes e do futuro.

Os estudos demonstram que as equipas mais inovadoras são as mais diversas. E apesar das organizações portuguesas não serem tão diversas como as americanas ou as inglesas, nos últimos 12 anos têm vindo a assistir a uma diversidade crescente. Mas a diversidade humana vai além da nacionalidade; está inscrita no género, nas gerações, nas profissões, no enquadramento socioeconómico da família de origem e, para ir ao mais elementar, nas formas de pensar e personalidade. Maior sensibilidade e capacidade para lidar com e liderar a diversidade humana é determinante para promover ecossistemas de trabalho com maior respeito pela diferença, mais atrativos para as novas gerações e talento, e menos conformistas porque promovem maior divergência. Equipas diversas, além de terem maior potencial de inovação, têm, no final do dia, maior capacidade para compreenderem e se conectarem com clientes de todo o mundo, com diferentes identidades e géneros, de todas as idades, com diferentes enquadramentos profissionais e socioeconómicos.

Estes contextos em mudança colocam o desafio de gerir a individualidade humana e de agregar os diversos interesses individuais. Nestes novos ecossistemas, os papéis de liderança precisam de invariavelmente evoluir rapidamente para o mentoring, o coaching, o desenvolvimento de cultura, a gestão de talento e inovação.

Os líderes, não conseguem lidar com tanta complexidade sozinhos, necessitam da inteligência coletiva a ativar nas equipas, para conduzirem as organizações para o futuro, e serem bem-sucedidos. O desafio está em unir esta diversidade e talento humanos através da criação de uma identidade coletiva, onde líderes através da mentoria, do coaching, da gestão de talento, estão ao serviço da cultura e do desenvolvimento das pessoas, em paralelo com a gestão do negócio.

“O potencial e talento podem recrutar-se, mas o verdadeiro desafio está em desenvolvê-los, utilizá-los e ativá-los através de práticas de trabalho e da criação de ecossistemas onde podem florescer e trabalhar de forma colaborativa para resolver os desafios e os problemas correntes e do futuro.”